Massa Renascentista
O castelo de Villa
d’Este - que fica em Tivoli, pertinho de
Roma - tem uma história muito rica.
Foi
encomendado por Ippolito d’Este, arcebispo de Milão que depois passou a cardeal.
Ele reconstruiu o castelo e implantou paredes adornadas de afrescos que
retratavam a vida elegante da época. Instalou diversas esculturas e fontes
borbulhantes.
Ippolito foi um dos mais ricos e pródigos cardeais do
Renascimento e criador da vila que levou o sobrenome da família.
Para homenagear seu
irmão, Ercole II, futuro duque de Ferrara, juntamente com a duquesa, promoveu um
banquete memorável em 20 de maio de 1.529, no palácio dos Este, em Belfiore,
uma comuna do Vêneto, na província de Verona, na Itália.
Sobre o banquete dado
pelo cardeal houve o registro de 54 convidados. A mesa foi montada no jardim
coberta com quatro toalhas, uma por cima da outra. Ao todo foram 18 serviços
para a surpresa dos convidados. Cada serviço compreendia oito pratos. E, nada de
carnes, porque o período era de abstinência.
E, o que foi servido?
Havia antipasto e
saladas, além de pães e vinho.
Água de rosas perfumadas para lavar as
mãos.
Pastéis de truta, ovos cozidos
condimentados e cortados ao meio, ovas de esturjão, fígado de lúcio (peixe) e
miúdos de outros peixes fritos com laranja, canela e açúcar, um esturjão cozido
com molho de alho enfeitado com a divisa do cardeal, peixe brema frito, sopa de
fécula de trigo, pizza com pastéis folhados ao estilo catalão e pequeninos
peixes do rio Pó, fritos.
Frutas e doces de sobremesa.
E, música.
Muita música para alegrar os
convidados.
A festa começou ao anoitecer
e se estendeu até às cinco horas da manhã, com distribuição de presentes a
todos. Luvas perfumadas, brincos, bússolas e anéis.
Todos os detalhes dos
banquetes da época, incluindo este, estão no livro de Cristoforo de Messisbugo,
sob o titulo, Banchetti, composizionidivivende e apparecchio, escrito em 1549, com treze edições até 1626.
Por qual motivo faço
essa breve citação de algo que ocorreu no Ritual Renascentista italiano?
Por um simples motivo.
Estava caminhando em
direção à Piazza di Spagna, perto das 22 horas, no coração do centro histórico
de Roma, pela elegante via del Babuino.
Ouvi seriamente os
apelos de meu estômago e perguntei para o Sr. P. Martini - um bom amigo italiano
- onde poderia apreciar uma comida, aos moldes dos banquetes
renascentistas, “respeitando o tempo e a
tradição romana”?
De imediato e com determinação apontou para a
direção oposta à piazza.
- Conheço um lugar que
poderá acomodar as nossas aflições, argumentou.
Caminhamos por alguns
minutos e paramos numa esquina
.
-É alí, indicando com o
olhar um pequeno restaurante no meio de uma rua estreita, nominada Vícolo del Babuíno.
Evidente que não há
nada que remeta aos escândalos gastronômicos daquele século. Os tempos são
outros. Os produtos também se modificaram, da mesma forma que os conceitos e a
estética. O que se vê são poucas e boas ofertas nos restaurantes de tradição.
Os bons restaurantes se limitam a uma entrada, com seus complementos, prato
principal um ou dois e sobremesa e seus acompanhamentos de bebidas.
Algumas conversas e
confissões de agradecimento pelas agradáveis companhias do Sr. Martini e sua amável Mme. Dorli Oliveira, partimos para uma mesa reservada na parte externa do
Restaurante Edy.
-O que vamos pedir?
Alertou Mme. M.L.
- Recomendo alguma
massa, tipo Spaghetti, Linguine e Tagliatelle, disse o Sr. Martini, com o qual
concordei de imediato.
Assim, brindamos a
amizade com um Spumanti Nani Rizzi, da região de Valdobbiadene.
Após alguns minutos
vieram os pratos.
Bem apresentados, com
textura e sabores particularmente interessantes. Atenção especial foi dada para
o Spaghetti al cartoccio (ai frutti di mare), uma das atrações da casa. A massa
veio recheada com camarões, lulas, mariscos e iscas de peixe, numa correta
combinação de sabores.
Depois vieram as
sobremesas, que foram alegremente consumidas.
Saí daquele local
histórico, pois sua construção data do século XVIII, certo de que a época
Renascentista deixou suas marcas nos atuais empreendimentos gastronômicos. Sem
os exageros, pois não havia limites e nem a consciência do que era correto.
Hoje, passados mais de cinco séculos, há a moderação e o equilíbrio, de forma
harmônica.
Voltamos a caminhar
pela via del Babuíno e paramos em frente a uma fonte de águas. Havia uma
escultura de um homem com corpo de um bode, representação de Sileno, personagem
da mitologia romana.
Era muito feio, e o povo, na época, apelidou de fonte do
macaco, pela similaridade.
E, assim ficou conhecida uma das ruas mais elegantes
do mundo.
Vá entender...
Serviço
Ristorante Edy
Vicolo del Babuíno, 4
Roma – Itália